O Risco da Penhora de Quotas Societárias

De todas as alterações implementadas pelo Novo Código Civil, Lei n° 10.406/2002, em vigor desde 11/01/2003, uma merece especial atenção.
O artigo 1.026, do citado estatuto legal, prevê a seguinte situação “O credor particular de sócio pode, na insuficiência de outros bens do devedor, fazer recair a execução sobre o que a este couber nos lucros da sociedade, ou na parte que lhe tocar em liquidação.”. Complementa seu parágrafo único: “Se a sociedade não estiver dissolvida, pode o credor requerer a liquidação da quota do devedor, cujo valor, apurado na forma do art. 1.031, será depositado em dinheiro, no juízo da execução, até noventa dias após aquela liquidação.”.

O artigo 1.031, prevê ainda que a liquidação dar-se-á após realizado levantamento do patrimônio da sociedade, por meio de balanço especial, salvo se o contrato social dispor de outra forma.

O artigo 1.026 em seu parágrafo único ajusta assim, que em caso de dívida particular de qualquer dos sócios, é possível a liquidação de suas quotas sociais para satisfação do valor devido ao credor.

A previsão inserida na parte principal do artigo não chega a estabelecer uma inovação, a não ser legislativa, visto que a jurisprudência já admitia a penhora dos lucros eventuais que o sócio-devedor teria direito na sociedade. Inclusive esse já era o entendimento assentado no STJ – Superior Tribunal de Justiça, ora absorvido pela lei.

Naturalmente a lei não poderia prever a adjudicação das quotas sociais por parte do credor, pela afronta à sua natureza jurídica inerente à 'affectio societatis', animus primeiro da reunião de pessoas para formação de uma sociedade.
Sendo assim, a liquidação das quotas sociais do sócio-devedor, acarreta inevitável transtorno para a empresa, para não definir de forma mais severa a situação.

Ora, se ocorrida a situação prevista no artigo, parece-nos que restará à sociedade duas opções. Como primeira, caberia à sociedade remir a execução pagando o valor devido em lugar do sócio devedor e sub-rogando-se nos direitos de credor, o que poderia ser resolvido internamente na empresa de forma mais simples, como por exemplo, pagamento do sócio para a sociedade através de lucros futuros a que teria direito; cessão de suas quotas sociais aos outros sócios em partes iguais, e assim por diante.

Como segunda, restaria à sociedade a conseqüência constante do parágrafo único do artigo 1.026, ou seja, a dissolução parcial da sociedade. O processo ao final redundaria em valor em dinheiro que seria depositado à disposição do credor para satisfação de seu crédito.
Em nosso entendimento, o legislador andou na contra-mão do animus legislativo até agora demonstrado, inclusive no projeto da nova Lei de Falências e Concordatas, que visa precipuamente a recuperação da empresa.

Em qualquer das duas opções mencionadas, a empresa será penalizada e sofrerá seqüelas financeiras, sendo descapitalizada, seja pela inevitável redução do capital social, seja pelo pagamento sub-rogado da dívida.

Tal fato pode colocar a empresa, em tempos de escassos recursos financeiros, em delicada situação para honrar com compromissos já assumidos e que fazem parte de sua vida operacional.

Esperamos que esta seja sempre a última solução para a resolução de ações judiciais desta natureza e, se ocorrida a situação descrita na lei, seja o processo transcorrido de forma a conservar a empresa, que gera empregos e tributos, exercendo assim sua primária função social.

André de Medeiros Larroyd
Agosto/2003